sábado, 7 de março de 2009

Público menos exigente que tudo aplaude ...

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SÃO PAULO – Quando algo ao final de um espetáculo deixa a sensação de vazio, como se faltasse tempero para que ele fosse servido ao público, é inevitável a reflexão sobre suas ‘deficiências’. Três peças em cartaz – Cold Meat Party (Festa do Presunto), Macho Não Ganha Flor e Sexo Verbal –, as quais considero providas de algum valor, convidam à reflexão já que, ao sair da sala, senti: ‘algo faltou’.

Teatro com sabor de sitcom

Um dos elementos mais desconcertantes do espetáculo – e que, infelizmente, parece ser a tônica determinante da encenação de Cold Meat Party (Festa do Presunto) – diz respeito às inserções de vinhetas musicais separando as cenas e dando a sensação de que estamos assistindo um sitcom, ou seja, um seriado de TV como Friends numa ampliada tela que é o palco. Sem preconceito algum com sitcons – sou fã de Friends – mas, acredito que no teatro deve-se fazer teatro

O espetáculo não é de todo mal e, ano passado, quando o assisti no Festival de Curitiba, lembro de ter feito critica bastante indulgente sobre ele. O texto de Brad Fraser, autor canadense do qual conhecemos Pobre Super Homem e Amor e Restos Humanos, tem um humor cáustico e ferino, é povoado por personagens arquetípicos de centros metropolitanos e evoca temas absolutamente contemporâneos como sexualidade, AIDS, câncer e as eternas dicotomias vida/ morte, sucesso público/ frustração profissional, dinheiro/ felicidade entre outros.

Até aí tudo bem, mesmo ressaltando que Cold Meat Party (Festa do Presunto) traga em seu pano de fundo uma realidade bastante distante da nossa, como o são as cerimônias funerais em países de origem anglo-saxônica, o que cria uma fissura entre o realismo que a peça parece se propor a acentuar e nosso cotidiano a quem essa linguagem cênica deveria se dirigir.

A cenografia e a encenação – aqui vale um à parte de que o fato pode ter a ver com a falta de recursos satisfatórios para a ousadia da encenação ir mais longe na forma de contar a história – não vão além do trivial em sua concepção.

Contudo, um público menos exigente quanto às propostas artístico-estéticas encontra seu quinhão de divertimento em Cold Meat Party (Festa do Presunto).

“A moda” do teatro em edifícios não teatrais

Lembro-me da ensaísta, escritora e teatróloga Renata Pallottini dizer, em certa conferencia, que, talvez, um dos caminhos profícuos da nova dramaturgia brasileira seria um diálogo entre texto, encenação e espaço onde ela acontece. O problema é quando um dos tripés desse diálogo está fora de eixo e não há comunicação com o restante: aí a encenação em espaços alternativos perde seu caráter de experimental diálogo e entra no terreno do modismo, caso do espetáculo Sexo Verbal em cartaz no Casarão do Belvedere.

Embora o título leve a crer tratar-se de um espetáculo apelativo, de teor erótico e vulgar, Sexo Verbal é apenas o título referente aos temas dos contos, crônicas e outros textos que formam o conjunto da peça.

Aqui o primeiro problema: mesmo que a maior parte dos textos seja de autores do naipe de Hilda Hilst e Caio Fernando Abreu, com origem de qualidade insuspeita, não há um trabalho dramatúrgico que una as cenas e unifique o espetáculo.

O caos causado pela falta de dramaturgia ganha acento com uma direção confusa de Áurea Karpor, que realiza as cenas em ambientes sem ordenação com o processo orgânico do texto, ou seja, a condição de diálogo entre espaço e ação, tanto para maior adesão do público à cena, quanto para que não pareça que o Projeto Bazar almeje, tão-somente, aderir a um experimentalismo como se ele fosse moda, fica bastante prejudicada.

Como Sexo Verbal é o segundo trabalho do nascente Projeto Bazar vamos torcer para que as arestas do grupo sejam reparadas em espetáculos futuros.


Faltou dramaturgia

Um dos grandes méritos do autor curitibano Dalton Trevisan, a quem o espetáculo Macho Não Ganha Flor, em cartaz no Espaço dos Satyros 1, é a ousadia e originalidade com que retrata a sociedade curitibana. Sem concessões. Ampliando o olhar, comumente unilateral, de uma Curitiba sem problemas sociais. Não que eu esperasse, nem tampouco desejasse uma peça de temática social. Os próprios contos do Vampiro de Curitiba estão mais interessados em reflexões sobre o ser humano do que em qualquer outra coisa, mas como em Sexo Verbal, a ausência de dramaturgia deixa o espetáculo com jeito de retalhos sem remendo.

João Luiz Fiani dirige com destreza e economia o trabalho do ator Marino Jr. Que, apesar de precisar cuidar de sua dicção, consegue o muito através desse pouco, ou seja, o recurso que utiliza é seu próprio instrumento físico – corpo e voz – para criar os diferentes personagens que interpreta. Esperava uma interação mais criativa com o telão e os vídeos que compõem o repertorio audiovisual do espetáculo, mas compreendo que Fiani preferiu focar na força interpretativa em lugar de um dialogo com mídias suporte de encenação.

A iluminação de Beto Bruel e a trilha de Jader Alves contribui com o bom desempenho do espetáculo que só não alcança vôos maiores devido à quebradiça estrutura dramatúrgica.

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